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Para que serve uma diretoria de felicidade?

Autor: Julio Sampaio

Repercutiu fortemente a notícia da criação da “diretoria de felicidade” em algumas empresas. Não sei se a Heineken foi a primeira a adotar tal nomenclatura, mas talvez tenha sido a de maior repercussão, pelo menos, aqui no Brasil. Antes, outras empresas adotaram denominações como: “gerência de saúde mental”, “gerência de bem-estar” e outras, todas elas indo numa direção semelhante. A adoção do termo “felicidade”, algo mais amplo, é um grande avanço, sendo acompanhado por alguns riscos. 

Um dos riscos é o que ocorre com outros termos, muito bem-intencionados, mas que acabam distorcidos por aqueles que pretendem apenas tirar proveito destas intenções. É o caso da “sustentabilidade”, do “ESG”, da “agenda verde” e de outros. Todos são importantes, fazem diferença e são propostas do bem. Ainda assim, eles são afetados em sua credibilidade, por elementos infiltrados de fachada, que visam apenas se apropriar do discurso. Nem sempre é fácil distinguir os autênticos dos greenwashing, dos falsos idealistas. 

A entrada do termo “felicidade” no mundo corporativo é mais uma aproximação da instituição mais poderosa de nossos tempos, a empresa privada, de práticas que atendem a anseios universais do ser humano e não apenas aos interesses de um grupo restrito. Os antigos filósofos já apontavam, há dois mil anos, que o maior desejo do ser humano é ser feliz e que a felicidade é o objetivo por detrás de tudo o que se faz. Mas o que é “felicidade”? 

O termo, aparentemente simples, costuma ter diferentes interpretações subjetivas, aumentando os riscos de distorções e até de preconceitos. A primeira conotação sugere a felicidade como alegria e para alguns ganha forma de um “oba-oba” superficial, nada prático ao mundo dos negócios. Quando trato do assunto, sempre me sinto forçado a lembrar que a felicidade inclui o prazer, mas não se limita a ele.  

Falar em bem-estar também é insuficiente. Posso sentir um mal-estar agora, por um resfriado ou uma noite mal dormida, o que não me faz menos feliz por causa disso. Entendo que felicidade é algo mais duradouro. Mas será que todos entendem assim quando falamos de felicidade? Até os estudiosos da área têm dificuldades para chegar a um acordo quanto ao termo. 

De comum, descrito largamente pela psicologia positiva, é a existência de diferentes dimensões, que incluem além do prazer (alegria), o engajamento, o propósito, os relacionamentos saudáveis e as realizações (como de objetivos e metas). Todas estas dimensões possuem uma alta aderência aos objetivos empresariais, uma vez que, comprovadamente, incrementam a produtividade e favorecem a expansão dos negócios. Elas podem ser estimuladas por meio do aprendizado e de práticas conscientes. 

A felicidade está diretamente relacionada a modelos mentais e a atitudes que nos aproximam ou nos distanciam dela, independentemente de acontecimentos externos. Atitudes de gratidão, altruísmo e resiliência produzem felicidade para nós e para os outros. Clientes, fornecedores e acionistas são beneficiados por elas. Felicidade tem tudo a ver com os objetivos do mundo corporativo, mesmo que isto contrarie o senso comum. 

No entanto, as empresas não podem fazer as pessoas felizes. Cabe a elas mesmas fazerem isto. Mas as empresas podem preparar o terreno (aqui sim, cabe o termo bem-estar), fazendo a parte que lhes cabem. Elas podem disponibilizar conhecimento sobre a felicidade consciente, estimular e reconhecer práticas. 

Decorridos quase dois anos da criação da diretoria de felicidade da Heineken, as notícias que chegam são positivas quanto às ações e quanto aos resultados mensurados. Ajudar líderes e colaboradores a serem mais felizes no trabalho e na vida, fazendo as suas escolhas conscientes. Penso que é para isto, em primeiro lugar, que serve uma diretoria de felicidade. Com todos os riscos das distorções, ela é muito bem-vinda. 

 

Julio Sampaio (PCC, ICF)  

Mentor do MCI – Mentoring Coaching Institute 

Diretor da Resultado Consultoria Empresarial